quinta-feira, 31 de março de 2016

Sua única proteção tem menos de 1 mm

Já pensou em como a única proteção conta o HIV e outras DSTs tem menos de 1 mm de espessura? Sim, a boa e velha camisinha... (ou camisa de vênus, como diziam meus primos mais velhos).

Eu sempre vi na camisinha o meu passaporte para a liberdade, para a libertinagem, para o exercício sexual da lascívia e da luxúria... o único "salvo-conduto" para uma vida sexual intensa e diversa (claro, nunca formulei assim, de forma tão precisa e objetiva... mas intuitivamente foi assim que enxergava a camisinha... o aspecto "chupar bala com papel" poucas vezes me incomodou de fato... diferente de alguns amigos que a vêem como algo extremamente brochante ou que contam muitos episódios de convites de seus parceiros casuais para não inclui-la...)


Semana passada eu tive a comprovação certeira de que isso é o que de fato nos protege... claro, intuitivamente sabemos disso, mas quando uma situação concreta se coloca, o impacto é muito maior. Se você olhar de um angulo positivo, alguns sustos podem ser extremamente pedagógicos.

Um cara que conheci no Grindr foi lá em casa... já nos falávamos há algum tempo e numa tarde em dezembro calhou de termos os mesmos horários livres. O George tem seus 25 anos, magrelo, alguns pelos no corpo, tinha feito sociologia, um ar meio bicho grilo, sotaque forte do interior... trocamos muita ideia, falamos de Marx, de Nietzsche, de Foucault... foi bem estimulante o papo... e inteligência tbém toca o tesão... fomos pra cama e o sexo foi ótimo... George me deixou muito à vontade e quando isso acontece, flui muito melhor...

O meu padrão ouro no sexo é o que chamo de "um bom revezamento entre machos"... todo mundo faz tudo... (sobre a questão de papéis "fixos" no sexo gay, me manifesto em detalhes num futuro post, mais específico). E assim foi... nos beijamos, nos chupamos, "nos comemos", "nos demos"... e a camisinha fez parte natural do script...(tudo bem, só não entrou no sexo oral... mas isso tbém é assunto pra outro post futuro).

George ainda foi uma 2a vez lá em casa, e rolou o mesmo script "revezamento entre machos". Daí ele viajou pro interior pra ficar com a família e se arrumou por lá, apareceu um trabalho e ele se mudou de SP. Ficamos em contato via zap-zap e trocávamos mensagens esporádicas...

Em uma destas msgs, ele me relatou que tinha pego pneumonia e que estava internado... o hospital não era lá essas coisas, ele estava preocupado com a estrutura de apoio... mas de qq forma ele estava sendo cuidado...

Eu: oi tudo bem? Carnaval fervendo aqui em sampa, rs...
George: Hum já está quente eh, aqui chove torrencialmente há mais de 30 dias, estou até com pneumonia, rsrs... Hoje eu estou de molho.
Eu: Eh sério que vc tá com pneumonia?
George: sério seríssimo. Pra ajudar o clima aqui está frio e úmido e chuvoso.

Eu: mas tem assistência médica boa ae?
George: então tem o SUS, atendem bem o básico, fui medicado com umas intravenosas e tô tomando dois anti-inflamatórios fortes, mas hj acordei meio zuado. Parei aí uns dias de trabalhar, tenho de me curar. 


A questão é que essa pneumonia não era curada e ele decidiu, por precaução, voltar a SP. Uma semana depois das msgs acima eu cantei a bola sobre imunidade:

George: e aí como tá o carna, eu to passando por uma pneumonia que ainda não deu jeito, fiquei internado essa semana.
Eu: nossa George q sério isso... preocupado agora. Manda notícias qdo der. Não seria melhor voltar pra SP?
George: então estou voltando hoje pra São Paulo, nem quero mais nada por aqui, está muito jungle aqui. Se eu tiver outra recaída eu tô fudido.
(...)
Eu: olha só, vc tem acompanhado tua imunidade? Além do pneumo, vc chegou a falar com um infecto?
George: então, meus homogramas demonstram que está muito bom meu sistema imunológico, mas eh a pneumonia, pois mesmo curado, a recuperação leva um tempo bom.
Eu: Puxa vida, não sabia que era assim. 

Esse papo rolou por fevereiro e na semana passada, escrevi de novo pra saber das coisas;

Eu: E ae... tudo bem? Sarou?
George: olá tudo bem? Descobri que estava com tuberculose e ainda HIV, comecei ambos os tratamentos, está sendo barra pra caramba...
Eu: Vc tá em sp?
George: Estou no interior me tratando.
Eu: Posso te lg mais à noite? Fiquei bem impactado com a notícia. Espero que tudo esteja sob controle. Não vou negar q fiquei bem assustado tbem... Apesar de termos tomado todas as precauções... não fizemos nada q trouxesse risco um ao outro. Independente de qq coisa, gostaria de conversar contigo. E pra tirar qq encanação da cabeça eu fui me testar no sábado, vou pegar os resultados hj no fim da tarde.
George: desculpe te deixar nessa encanação, o que eh claro que ficaria, por favor me fale do resultado, mas nós nos prevenimos...
Eu: Vc fez super bem de me dizer... vms tratar isso da melhor forma, somos adultos e cientes dos riscos que corremos na vida. Sei do impacto q uma notícia como essa tem na vida de qq pessoa. Não tem mto o que dizer, mas tenha certeza q não he o fim do munco, vc vai poder levar uma vida praticamente normal. 
George: sim eh algo que abala um pouco, saber do tamanho da fragilidade do nosso corpo, eu não sei bem, quanto tempo fico, pois quero me adaptar mais ao medicamento da tuberculose e do retroviral, que andam me revirando o estômago, posso passar mal à vontade lá, o tratamento eh de 6 meses, esse medicamento me impacta muito. 

Pro meu mais completo alívio, meus resultados deram todos não-reagentes (HIV e sífilis). É sempre um "parto" aquele período de espera do diagnóstico... passa um filme na sua cabeça, vc fica pensando no que vai fazer caso dê positivo (acho que esse sentimento é universal).

Muito provavelmente eu já tenha nesses anos tido contato com pessoas soropositivas (que podiam ou não saber do seu status sorológico). Mas nunca antes uma destas tinha me relatado a condição de HIV+ (antes ou depois do contato - diferente, por exemplo, de um amigo que saiu com um cara e o cara já no segundo encontro contou pra ele - e disso saiu um namoro que durou um ano - e que só acabou porque o cara era muito muito mala, e não porque era HIV+).

Fica pra mim a lição (e mais do que isso, a CONFIRMAÇÃO) de que a camisinha é nossa única proteção efetiva, garantida, 100% contra HIV (estou ciente de que ela pode não prevenir totalmente outras DSTs como HPV, mas isso não justifica qualquer intenção de não usa-la). Eu sou um cara que vê o sexo como a mais incrível manifestação de liberdade, e isso inclui multiplicidade de parceiros, livre escolha com quem transar, e tão cedo não pretendo abrir mão disso. Bom, se não pretendo abrir mão, só há um jeito [óbvio] de me cuidar e me proteger. E quando falo em cuidado e proteção, que fique claro ser em relação ao vírus, e não em relação às pessoas... jamais passaria pela minha cabeça não ficar com alguém que me atraísse pelo fato de ser HIV+... poderia gerar certo receio, evidente, mas não abriria mão de viver isso.

 É isso... a vida segue... ainda não sei se esta história terá algum impacto em mudar alguma atitude ou comportamento meu... se continuarei a sair com várias pessoas, se continuarei a ir à sauna... bate um pouco de medo, bate um pensamento do tipo "será que estou me arriscando ao sair com tantas pessoas?"... O que sei é que vale a pena exercer sua liberdade. Exerça-a com o mínimo de responsabilidade... vale muito a pena!

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