segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Passivos que metem bem - parte II

'Se precisar, eu como.'
  (de um colega de uma firma parceira, ao explicar suas preferências e o casamento dele).

"ou sobre supostas incompatibilidades sexuais" (poderia ser um ótimo subtítulo para este texto).

Eu já tinha feito uma primeira tentativa de problematizar a questão. Não foi muito fácil, então consegui ir até certo ponto.

Nesses últimos dias acho que consegui evoluir um pouco mais na dimensão do que queria analisar.

Vejam comigo a seguinte situação:

Pensem em dois caras que curtem ser passivos. Ou que 'preferem' ser passivos. Eles tem mais prazer sendo penetrados do que em penetrar. Mas a depender da situação, também não tem problema em serem ativos. Seriam aquela categoria do grindr chamada "versátil mais passivo" (aliás, acho ótima essa gradação que o grindr fez, ajuda bastante na pesquisa).

Imaginem que eles se conheçam e se encontrem. Rola uma transa e de alguma maneira eles comunicam um ao outro que curtem ser passivos. Quando um diz isso ao outro, o outro toma como certo que, mesmo curtindo ser passivo, também vai ter de comer. O famoso "flip flop" (outra dica de pesquisa quando buscar filminhos neste estilo).


Ao se revezarem, para a surpresa de um imaginário observador, o passivo que assume a posição de ativo e penetra o outro, o faz de forma muito bem feita, de maneira que satisfaz o parceiro. Mas isso tem um certo "custo", uma diminuição do prazer próprio, em benefício do prazer alheio. Um 'esforço' que, a princípio, não caberia dentro de uma transa. 

Ou seja, num revezamento, um dos passivos assume a posição de ativo, faz o trabalho direitinho e deixa o parceiro bastante satisfeito. Na sequência da foda (ou na foda seguinte), invertem-se as posições; a satisfação continua a mesma e aquele certo esforço também (a diferença é que as sensações trocam de lado).  



Vocês já tinham imaginado uma situação assim? E será que ela é sustentável a longo prazo? De uma situação assim poderia nascer um relacionamento?

E o engraçado é que ando numa fase muito mais ativa... (longe de me gabar disso, até me sinto incompleto dessa forma, mas os caras que tem aparecido não se mostram nem um pouco a fim de serem ativos comigo... e eu acho que tenho mostrado uma pegada mais ativa que, talvez, já deixe as regras claras logo de cara... talvez seja algo até meio intuitivo, mas que tem me impedido de comunicar meu desejo de forma mais autêntica.)

Uma sensação diferente essa semana foi a de perceber que os caras não tavam muito a fim e não mostravam essa pegada... daí eu concluo que é melhor assumir o papel de ativo e conduzir a transa dessa forma do que ser passivo e ser comido de forma não muito animadora.


Nesses momentos eu aproveito pra aprimorar minhas habilidades, testar coisas que ainda sinto um pouco de insegurança (por exemplo, meter em caras mais altos do que eu, ou com a bunda muito grande)... 

É engraçado porque quando não tenho medo da rejeição, de ser julgado pela performance (às vezes nos sentimos assim quando estamos com alguém que curtimos muito e é muito importante pra nós), eu me saio super bem e me sinto super bem depois (como se você tivesse terminado bem aquele treino super pesado de pernas, hehehe, ou vencido a competição de natação). 

Eu posso e muitas vezes curto ser ativo... varia muito de parceiro pra parceiro. Antes achava que não havia como, era preto no branco, ou era uma coisa ou era outra... mas tenho visto (e que bom, ainda bem!!!) que há gradações bem interessantes e novos arranjos bastante prazeirosos podem surgir.

Mas que, de fato, saber que o cara que quer dar pra mim também se habilita a me comer, ah colega, isso facilita bastante as coisas! 😈 

Esta questão tem um link muito interessante com um texto que eu havia lido há algum tempo e que tinha separado para comentar aqui no blog. Ele tem o sugestivo título de: What to do when you´re in love - and both bottoms (o que fazer quando vocês estão apaixonados - e ambos são passivos).

E a regra vale para dois ativos também.

O texto começa apontando para uma possibilidade muito concreta: você conhece alguém interessante em um contexto não sexual e se interessa. Seria o caso de abortar logo de cara a possibilidade de uma relação?

O autor nos dá ao menos três saídas: A 1a, ter abertura para que ambos tenham relações com terceiros que estejam mais sintonizadas com seus desejos e necessidades (por exemplo, dois namorados passivos que transam com um terceiro ativo, ou vice versa, dois namorados ativos que pegam juntos um terceiro passivo, ou mesmo cada um transando separadamente, mas tudo muito bem conversado previamente).

A 2a, é que, de tempos em tempos, ambos tenham a capacidade de "ceder" e satisfazer desejos e necessidades do outro. Isso significa passivos comendo e ativos dando, pelo bem maior do relacionamento (um esforço 'pequeno' que contribui para algo de muito mais significado - e o esforço tem de ser genuíno - nada de fazer as coisas com nojinho ou pela metade).


[Just] because you have to, because you care about him.

Se ambos são ativos, ser passivo pode te fazer ser um ativo ainda melhor, pois você vai sentir na pele o que é estar neste papel. Se ambos são passivos, recursos como brinquedos sexuais podem ser ótimos aliados e aplicar no outro os seus próprios conhecimentos sobre estimulação anal pode ser algo muito romântico e ajudar na construção da intimidade do casal.

A 3a saída na verdade é mais um lembrete, de que a intimidade sexual pode ser encontrada em muitos outros locais que não somente o sexo com penetração (no caso o autor fala um pouco de sua experiência com S&M - sadomasoquismo e afirma que relações 'dominante-submisso não penetrativas' podem ser muito mais satisfatórias e estimulantes).

E mais, é preciso superar esta dicotomia tão rígida que separa ativos e passivos, como se morassem em planetas diferentes. À medida que o relacionamento se desenvolve, essa dicotomia inclusive tende a ficar menos rígida. O ser humano é tão adaptativo, pode inclusive ser um momento de explorar novas facetas da sua personalidade e aprender e aprimorar algo a que você não estava acostumado.


E isso, na verdade, nada mais é do que aquilo que precisamos fazer em qualquer relacionamento: investir, comunicar, explorar e ocasionalmente, colocar as necessidades do parceiro antes das suas.

SOMOS [MUITO] MAIS DO QUE AQUILO QUE FAZEMOS NA CAMA. 

Não se limite. Não limite o outro. 

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Daily life of a gay couple


Povo, eu estou simplesmente encantado, apaixonado por estas tirinhas chamadas "Daily life of a gay couple" (a vida diária de um casal gay).


Song Inkollo é um artista francês que divide com seu público os aspectos cotidianos do seu relacionamento com o namorado, Joe


Eu o conheci inicialmente pelo perfil no Instagram (inkolloart) e depois cheguei a uma espécie de site que abriga trabalhos de vários artistas, chamado Patreon. A proposta é muito bacana! Os artistas hospedam seus trabalhos lá, o público os segue e pode apoia-los com uma quantia mensal. No caso do Song, você pode colaborar doando 1, 5 ou 50 dólares mensais e cada valor te dá um nível diferente de acesso (O site fica com uma pequena porcentagem a título de manutenção).

Eu nunca havia apoiado um artista dessa forma, foi a primeira vez e fiquei muito feliz em poder fazê-lo. Ganha o artista, que tem uma fonte de renda para se dedicar a fazer arte e ganham os fãs, que quase diariamente podem conferir novos trabalhos e atualizações.


Eu ainda estou explorando as tiras, ele geralmente publica uma a cada um ou dois dias, então há bastante material. Gosto muito do estilo de desenho do Song. Ele consegue reproduzir algumas expressões faciais e isso deixa os personagens muito, muito fofos hehehe...


Há alguns temas gerais pelos quais ele organiza o trabalho. Há tiras relacionadas a mangás (ele é super fã), há tiras sobre situações simples como passeios, idas ao supermercado, a gata (que infelizmente morreu há algumas semanas), conversas na cama, amizades, etc... E há as tiras sobre a vida sexual do casal... HOT HOT HOT!!! Novamente... Os desenhos são incríveis!!!


O que eu achei mais legal é que as tiras retraram um relacionamento de verdade, as dificuldades, os pequenos prazeres, as tretas, as diferenças e a intimidade construída pelo casal. Uma relação de carne e osso, com gente normal. Pra mim foi inspirador!


Claro, não sabemos de todos os detalhes... Do que vemos nas tiras, a vida sexual deles é bastante prazerosa e ativa e eles estão muito satisfeitos um com o outro. Parece funcionar muito bem pra eles.

Não vou negar... deu vontade de ter algo bem assim!


terça-feira, 12 de dezembro de 2017

Os putos da família



Com todo respeito eu te pergunto:
Você quer, você quer ousadia?
Você quer, você quer putaria?
(MC Kátia, Medley brabo, Roda de Funk)

A conversa começou quando eu enviei pro meu primo Arthur uma pérola do autêntico funk carioca com Mc Kátia, uma das minhas funkeiras prediletas.

Foi meu primo Arthur quem, há uns 13 anos, me apresentou à Tati Quebra-Barraco, declamando de cor aquelas letras incríveis, das quais a mais clássica era a icônica Fogão Dako (me lembro até hoje comprando o cd lá na Uruguaiana, no centro do Rio, numa semana em que estava lá fazendo o campo da minha dissertação de mestrado). 

O Arthur é de uma geração de primos mais nova que eu. Acho que a Tati foi a 1a descoberta de algo em comum que tínhamos e foi uma curtição só (óbvio, porque ninguém mais curtia, e nós nos deliciávamos com as letras lascivas e um tanto quanto toscas - é tosca mas a gente adora!).

Um parêntesis sobre o disco da Tati (que acredito ter sido o seu disco de estréia - depois de algumas músicas já feitas e de já estar estourando com alguns sucessos pelos bailes funk cariocas).


Eu acho esse disco incrível por vários motivos: foi produzido pelo lendário DJ Marlboro - e essa produção foi fundamental para o disco se tornar o clássico que se tornou. Meu... os caras samplearam Papa don´t preach da Madonna e aquela musiquinha de cornetas da trilha do Rocky Balboa (que depois seria também sampleada pela Mia e pelo inesquecível SapaBonde). E ainda teve participação de MC Serginho (aquele do "abre a boca não se espanta, vou gozar na sua garganta!"). 

Confesso que nunca tinha visto linguagem sexual tão explícita e ao mesmo tempo criativa e engraçada... misturada ainda com um tom super afirmativo de poder e desejo feminino, inclusive pondo os machos num papel submisso. Certamente uma miscelânea muito interessante que reflete bem o Brasil urbano periférico dos anos 2000 (e falo 'periférico' aqui sem nenhum tom pejorativo)   .

O funk da Tati Quebra-Barraco foi só o chamariz de mais afinidades que com o tempo fomos descobrindo nas conversas que tínhamos. 


Então a conversa pelo messenger deu-se dessa forma:
HS: Ouviu o arquivo que mandei? 
 A: Uma aula! Tinha escutado e esqueci de responder. Ainda apoio as amantes!
HS: HAHAHAHA. É um bom debate para termos no natal. Fiel X Amante. Òbvio que vc apoia as amantes. E vc, como tá?  
 A: Tô trabalhando mais que tudo. Estava fraco de mulher... só que chega fim de ano, acho que bate aquela dor no coração de ainda estar sozinha e aí venho de uma semana boa. Em vez de fisgar tô batendo rede hahahaha.
HS: Hahahaha. De umas três semanas pra cá tô batendo rede aqui tbém... muito peixe graúdo. Mas amor mesmo que é bom... nada... só putaria mesmo! A gente vai se virando como pode. 
A: Pois é... difícil largar esssa vida, ainda mais quando vai aparecendo... em dezembro só vou ficar entre natal e reveillon. Mas preciso colocar papo em dia contigo. Vidinha de adv está começando a ficar boa.
HS: Faremos isso no natal meu primo! Fico feliz em saber que eu não sou o único puto na família! Quer dizer, putos têm muitos ali! Mas que põem a cara a tapa sem hipocrisia, só nós dois mesmo! hahahahahaha. 
A: hahahahahaha sim. Sou com um sorriso no rosto.
HS: Eu tbém!!!! Queria que a tia Renata ouvisse uma conversa nossa hahahahaha uma básica já estaria de bom tamanho... sem entrar em temas mais adultos hahahahaha depois preciso te contar das minhas experiências "químicas".  
A: puts verdade! no fim acabei nem experimentando aquela lá.
HS: precisa ver o cardápio disponível kkkk ano novo vou pro Rio! E quero saber da vida de advogado tbém, como tá sendo, o que vc tá fazendo. 
A: Tô recebendo até amor como pagamento hahaha. Está indo bem.
HS: e não é válido?! hehe.  
A: Mto. Cliente satisfeita com uma liminar.
HS: hahahahaha só não deixa a OAB saber. 
A: só vc que sabe.
H: tranquilo hehehe... vai continuar assim hehehe.
Sim, o Arthur é hétero. 100%. Mas desde que soube que eu era gay nunca manifestou uma pontinha sequer de preconceito e foi um dos que melhor me acolheu. E quando nos encontrávamos (não eram muitas vezes pela correria da vida de SP) eu fui me sentindo à vontade pra abrir coisas com ele sobre minha vida gay. Lei da ação e reação, ele também começou a partilhar as coisas dele comigo. E acho que acabei virando um confidente dele.  

O bicho tem mel! Fato. É impressionante a mulherada na cola dele. E do que conversávamos, ficava evidente que ele sabia muito bem como satisfazê-las na cama. E a putaria rolava solta na faculdade. Ele tem um sorriso dengoso no rosto que deixa elas derretidas, uma malandragem doce, mas que sabe botar pressão quando precisa - ou quando elas pedem.  

Até que lá pelas tantas ele começou a namorar mais sério e ficou noivo. Acho que bateu uma pressão da família, um certo senso de "sou adulto, preciso trabalhar e me encaminhar na vida, constituir família". Mas até onde entendi, chegou uma hora que a relação começou a ficar muito ruim, desgastada e a noiva, muito insegura e bastante enciumada, decidiu terminar. Eu não sei até que ponto isso foi uma jogada dela, mas o fato é que ele não quis voltar. E ela se arrependeu amargamente pela infantilidade que fez. 

Ele tinha terminado há pouco no dia em que nos encontramos na casa do irmão dele. Fomos fumar lá na área de serviço (detesto cigarro, mas em raras ocasiões puxo um trago com quem me oferece) e ele me contou da retomada da putaria, das aventuras com as estagiárias do escritório (ele ainda não tinha se formado), das idas na casa de swing e das noitadas na república em que estava morando. Era uma frequência de dar inveja. 

Foi legal que nesse dia eu meio que percebi que talvez ele fosse um pouco como eu - descobriu uma certa liberdade e desapego que são muito prazerosos de serem exercidos, o 'estar solto' na vida, relacionar-se com diversas pessoas, usufruindo e interagindo, com trocas que envolvem não apenas sexo, mas que se estabelecem também a partir de outras afinidades (a relação dele com as mulheres não era só sexual, de ir pra cama, meter e gozar... envolvia outros elementos que tornavam as histórias mais interessantes - e por isso mesmo, mais duradouras). Percebia que as mulheres viam nele coisas que não viam nos namorados tradicionais.

Essa liberdade - que tanto ele quanto eu descobrimos e passamos a exercer - de tão deliciosa que é pode ser um caminho sem volta... Se acostumar com o passado pode ser muito difícil, senão impossível. 

Eu disse com muita ênfase que ele não precisava forçar a barra pra se adequar a uma expectativa da família, que ele não precisava noivar e casar só porque era isso que esperavam dele e que era legal pensar nisso, porque talvez ele não fora feito pra casar como o irmão dele, por exemplo. 

O papo no messenger fez mais sentido ainda nos dias atuais, depois de uns embates muito desagradáveis que rolaram no whatsapp da família envolvendo a "tal" ideologia de gênero. Vários familiares conservadores, inclusive um tio que eu julgava ser progressista, destilando falta de conhecimento e histeria; eu não consegui me conter, fui pro embate e acabei me expondo, dando exemplo de situações minhas como forma de mostrar alguns absurdos que estavam sendo propagados. Foi algo que me entristeceu muito e reconhecer no Arthur alguém mais próximo da minha maneira de ser e pensar foi um tanto quanto alentador. 

Essa conversa que tivemos na casa do irmão dele já deve ter uns dois anos e desde então não me lembro de ele ter namorado sério de novo. E pelo teor da conversa da semana passada, ele está muito bem assim. Não sei se vai ser por muito ou pouco tempo, e isso não importa. O que importa é que agora, nesse momento, ele está bem, curtindo a vida, se permitindo e tendo histórias e momentos interessantes e intensos. Não é hora de se preocupar com o futuro (ao menos no caso dele).

Sim, somos putos. E com um sorriso no rosto!