terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Pensamentos na balada parte II - Sábado

E sábado foi dia de The Week, logo na sequência de um aniversário de outro amigo querido nosso!

Batidão...

Não foi um dia de Epifania, como em outra ocasião, mas ali me vieram alguns insights interessantes.

O 1o veio de um encontro com o Pedro. Pedro é um curitibano quase-cinquentão lindo, lindo, sorridente, cabelo grisalho, voz mansa e muito gente boa. Tem uma história super interessante, foi casado com uma mulher por vários anos, tem dois filhos adultos, mas ali pelos trinta e poucos se separou e saiu do armário. Namorou um cara por uns 12 anos, sendo que nos últimos anos tinham uma relação aberta que parecia bastante equilibrada. Pode ser considerado um ótimo representante dos tais D.I.L.F.s (em breve teremos um post sobre isso, aguardem).


De uns anos pra cá Pedro é figurinha frequente no circuito gay de festas RJ-SP-BSB-Floripa, sempre se divertindo bastante com seus amigos, que o adoram! Muito legal isso de, já mais velho, vc voltar às baladas num outro formato, em um outro momento de vida e com uma cabeça diferente da que quando era universitário e tinha 20 anos. 

Pedro passou um período solteiro e de uns tempos pra cá eu o estava vendo com mais frequência na The Week, sempre acompanhado de outro cara. Isso foi evoluindo durante uns meses, até que eles oficializaram o namoro, com direito a posts apaixonados, fotos e mudança de status nas redes sociais. 

Eu não quero soar preconceituoso, mas não vou deixar este risco me impedir de escrever o que quero. Eu, sinceramente, acho o Pedro muito lindo e o namorado dele muito feio e meio desengonçado. Sabe quando destoa? 

Mas por que eu estou dizendo isso? (e dessa maneira meio tosca) Por que parece algo que o Pedro nem leva em conta, não se importa sobre o que os outros irão achar (e certamente devem rolar comentários maldosos), se destoa ou não destoa, se ele é muito mais lindo, gato e charmoso do que o boy dele. E que bom que é assim, que outras qualidades do cara lhe agradaram a ponto de ele querer namorar, eles estão sempre juntos na balada e fora também, curtindo a dois. 

Quando nos encontramos, eu brinquei com ele: que legal, agora te vejo direto aqui! Ele encheu a boca pra falar e me respondeu com alegria: aaaahhh, é que eu tô namorando!

Gente, posso ser sincero? Eu conheci um cara há uns anos e a gente se deu muito, muito bem sexualmente. Está no meu Top 3 de melhores trepadas da vida. Mas eu achava ele muito feio, um pouco esquisito e eu sei que foi por causa disso que eu nunca sequer cogitei a possibilidade de namora-lo ou de estreitar laços. E olha que eu tinha um prazer descomunal com ele e ele mandava muito bem na cama (além de ser um cara gente boa e super confiável).

Bom, e não é que o Paulo me acompanhou no sábado também? Assim minha cabeça dá nó... (e a de quem lê aqui também, hahaha). Paulo foi comigo no aniversário e depois pra balada. Só que aconteceu exatamente a mesma coisa da 6a feira. Ele ficou na dele enquanto dançávamos na pista... eu percebi e não me fiz de rogado quando um boy veio falar comigo e me tascou um beijo de língua quente e forte. 

Confesso que beijei mais pra fazer ceninha e mostrar que sim, eu posso ser super atencioso e [com ele], mas não me custa muito tocar o terror e incendiar Roma [sem ele].

Pois dito e feito. O boy saiu pra ir ao banheiro e meus amigos quiseram subir ao camarote... a partir daí ele já se aproximou e se comportou como um ficante meu da noite [e nem ficou com ninguém além de mim].  

Bom, a balada estava rolando e eu já cansado... depois daquela conversa um pouco tensa com meu pai, eu tenho evitado tomar químicos de qualquer tipo, a conversa ainda está ecoando na minha cabeça e no meu coração. O problema é que isso dificulta um pouco curtir a balada, eu já não tenho vinte aninhos, então é um desafio encontrar estratégias pra não se sentir cansado. 

Um energético com vodka me segurou bem por umas 3 horas, mas aí realmente não deu mais. Daí decidir ir embora. Me despedi do Paulo e, pra minha surpresa, ele decidiu ir embora também, comigo. 

Saímos ali do grupinho em que estávamos e ao cruzar a pista lotada de homens lascivos eis que me deparo com uma senhorinha que certamente tinha mais de 60 anos, cabelo curto grisalho. Não sei o nome dela mas vou chamá-la aqui de Dona Domingas.

Dona Domingas - baladeira na The Week

Gente, eu sou super tímido pra abordar pessoas que não conheço, mas eu achei tão incrível ver aquela senhora que não resisti e parei pra conversar. Perguntei se ela estava lá pra dançar (pergunta mais óbvia né? #peloamor...) e ela disse que sim, até me respondeu um pouco na brincadeira (pela obviedade da pergunta - mas eu juro que fui super espontâneo, hehehe). 

Dona Domingas me disse que gostava de ir lá para se divertir, que ela gosta de se divertir e brincava dizendo que os amigos dela só podiam ir embora da balada depois que ela fosse. O Paulo estava junto, tão cansado quanto eu, então acabei não ficando muito lá, mas sinceramente espero encontrá-la lá em um dos próximos finais de semana e continuar a conversa. 

Eu acho que isso me chamou a atenção em especial por ter visto uns dias antes uma reportagem relatando a cruel situação de idosos gays que, sem terem como contar com o apoio da família, vão para asilos e casas de repouso, são praticamente obrigados a entrar no armário novamente e a não revelar sua orientação sexual pelo receio de sofrerem represálias - não somente por parte dos demais moradores mas também por parte de funcionários. 

Essa senhora me fez um bom contraponto à reportagem triste e devastadora e, assim como o Pedro, que não se importa se o namorado dele é mais feio do que ele, a senhorinha também não estava nem aí se ela não se "encaixava" no perfil tradicional de quem vai à The Week

Novamente, não me entendam mal. Eu, sinceramente, acho a The Week um lugar relativamente democrático, eu mesmo não me encaixo no perfil barbie sarada, mas estou lá direto dançando sem camisa, feliz da vida, e fazendo [quase] tudo que tenho vontade... e vejo muita gente que não tem 6-pack e isso nunca foi motivo pra não tirar a camisa e, quer saber, ninguém está nem aí, até porque em parte São Paulo facilita e valoriza esse anonimato e esse "não se importar" com a vida alheia.

Eu quero justamente ressaltar essa liberdade que os dois tiveram em romper estereótipos e em não deixar que uma suposta sensação de inferioridade ou de não-pertencimento os impedisse de fazer algo que queriam e que lhes dava prazer. 

E quantas vezes nós já deixamos de fazer algo por ter esse tipo de sentimento? Eu, várias.

Por fim...a noite terminou de forma "bunitinha"... uma cena doce minha e do Paulo. Eu não sei como, mas apps como Uber e Cabify simplesmente não funcionam nas proximidades da balada. Vc precisa ir pra rua de cima e aí os carros já ficam disponíveis. 

Ficamos numa esquina esperando alguns minutos. Eu sentei num banco improvisado que tinha ali e o Paulo se sentou no chão da calçada, se aninhou na minha perna, virou a cabeça e veio me beijar.


Juro... me derreti com algo que pra mim soava tão carinhoso...

Ele apoiava as costas na minha perna e eu o abraçava... ficamos ali, nos beijando devagar, sem pressa, um beijo por um beijo (diferente daquele beijo que é a introdução de uma transa. só agora me dei conta dessa diferença entre os beijos... mais um insight hahahahaha).

Os dois, cansados, desmaiaram no táxi, ele ficou em casa e eu segui pra minha. Nenhuma menção à possibilidade de transar e eu acho libertador vc ter a opção de terminar seu fim de noite em casa, sozinho, deitado na cama para dormir e descansar. Sexo pode ficar pra outra hora, não precisa ser roteiro obrigatório de fim de noite.

Eu inclusive acho que a qualidade piora (salvo naquelas ocasiões onde o tesão tá batendo muito forte). Pra mim tem de ser algo muito promissor que me faça abandonar aquele momento mágico em que vc chega da balada, come algo gostoso, toma um banho morno e cai na cama.


Essa situação com o Paulo tá me incomodando um pouco... eu mudei a expectativa que tinha anteriormente, passei a querer mais (e diferentes) momentos com ele, então a chance de frustração aumentaria mesmo.

O Mário, como sempre, é meu fiel confidente e psicólogo... ele acha que o Paulo curte minha companhia, mas não quer romance e não vai se esforçar pra nada além do que já existe. 

Simples assim [mas quem disse que a gente enxerga o simples, né?].

Minha primeira ideia nessas horas é romper contato, não ligar mais, não chamar mais pra nada... mas isso não seria uma atitude meio infantil, daquelas crianças que, quando contrariadas, levam a bola embora da brincadeira? Típica reação narcísica, não?

Vc não aguentaria conviver com a situação que não é a que vc queria, mas que ainda sim pode ser legal? Por que não desfrutar destes poucos e bons momentos quando vcs estão juntos, sem fazer idealizações? Consegue segurar a expectativa?

Sinceramente, não sei se quero e não sei se consigo. Não preciso também ficar buscando a essa altura situações de sofrimento, tortura e provação, isso aqui nem é reality show, nem período da quaresma com penitência.


Eu fico todo arrazadinho porque isso está acontecendo comigo, reclamo das coisas, mas eu já estive nessa exata situação com outras pessoas, exatamente assim - só que do outro lado...

Então não é nada pessoal, são processos que acontecem, a gente se melindra, e aí nosso Superego dá um jeito de nos dar um tapinha na cara e nos lembrar que a gente não tem nada de especial pra supor que isso não poderia ou não deveria nos acontecer - como se a gente tivesse algum privilégio em relação aos outros 'pobres mortais'.

E assim a vida vai seguindo, a gente sofre com as situações, mas mais importante até do que não sofrer (até porque é muito difícil controlar isso - sofrimento e a frustração são certezas nessa vida) é aprender a lidar com esse sofrimento, superá-lo e tirar proveito disso para o próprio amadurecimento.

Vou fechar o texto de maneira rasa, mencionando o tal 'imperativo categórico' da filosofia de Kant, que mais ou menos fala assim: quando agir, aja como se a tua ação devesse ser considerada uma regra universal a ser seguida por todas as demais pessoas.

Se eu estou sofrendo por algo que "me fizeram", talvez devesse pensar mais quando estiver do outro lado da história fazendo algo semelhante, ou seja, ainda que eu esteja mais atento à comunicação das intenções [já falamos sobre isso em dois posts intitulados Comunicação e expectativas parte I e parte II], talvez seja o caso de ser um pouco mais cuidadoso nas relações. Talvez 'apenas' comunicar bem e de forma objetiva não seja o bastante nesse tabuleiro cheio de sexo, paixão e amor.

Ter cuidado com as pessoas pode ir bem mais além do que simplesmente comunicar suas intenções. Pode significar inclusive não fazer algo, ainda que com o desejo e o consentimento alheio.

A pensar... 

Pensamentos na balada parte I - Sexta feira.


I, recommend getting your heart trampled on to anyone, yeah (Alanis Morissette)


Esse fim de semana foi bem cansativo... mas produziu boas reflexões... (e reflexões muitas vezes são dolorosas)


O Leandro me chamou pra uma baladinha meio conceitual/meio bagaceira na 6a feira. Fazia muito tempo que não saíamos juntos porque ele tá namorando, tá em outra vibe, diferente da minha. Essa mudança de vibe, novos interesses, novo namoro, acabou fazendo com que a gente se distanciasse, porque antes éramos muito, muito próximos. 

De uns anos pra cá eu e o Mário acabamos entrando numa sintonia mais fina, mais interesses em comum, então estamos quase sempre juntos. 

Assim, achei que seria ótimo sair com o Leandro e alguns outros amigos. Mas chamei o Paulo para nos acompanhar também. Pois é, de uma trepada inicial sem compromisso via grindr, ficamos mais próximos ao longo do últimos meses, de forma natural; nos encontramos várias outras vezes, inclusive no ano novo. Ele conheceu alguns amigos meus, acabou que eu o tenho chamado pra fazer outras coisas que não necessariamente trepar. Pra resumir: é um cara fantástico.


Mas eu sinto que ele continua me vendo como um P.A. [pau-amigo] que, por sorte, acabou agregando alguns outros benefícios... um bom papo, uma boa cia, amigos bacanas, companhia para lugares legais. E depois do nosso encontro no ano novo, eu tenho sentido menos disposição dele em me encontrar (ao passo que a minha aumentou).


Tô dizendo isso porque quando nos encontramos na festa, ele foi meio protocolar comigo, um selinho rápido e parecia estar lá mais como amigo do que como um peguete ou P.A. E o pior é que eu peguei um carinho nele, queria ficar junto, meio que 'namorandinho' (eu sempre me ferro quando entro nessa vibe... de novo aquela coisa de querer encontrar morangos numa plantação de cana de açúcar). 

A balada conceitual/bagaceira estava hétero demais pro meu gosto e não tava rendendo nada... daí nós dois decidimos ir pro Chá da Alice, que tava rolando no mesmo dia. Aí sim colega... típica festa... pencas de viados, coisa maravilhosa!!! Ali me senti em casa. E ao chegar dei de cara com um casal amigo do Laio e do Roberto que são ótimos e também adoram interagir com o grande público!

Já que o Paulo não tava me dando bola, eu desencanei e fui beijar o Daniel, e aí a brincadeira começou forte... o Marcos, marido dele, logo veio na sequência (mas eu curto mesmo é beijar o Dani, a química entre nós rola bem gostosa...  então os poucos beijos no Marcos foram o pedágio, necessário, pra poder curtir um pouco o Dani). O Paulo topou com um conhecido dele e começou a beijar também, mas um tempo depois não é que ele veio pra cima de mim e aí me deu um beijo decente, daqueles bons que ele sabe dar (e que eu adoro). 

Pois então precisou eu ficar com outro cara na frente dele pra ele depois vir e ficar comigo. Não sei se ele preferiu se certificar antes de que eu estava mais livre, não ia ficar colado nele, pra então me beijar ou se simplesmente bateu um pouco de sentimento de posse e ele não quis ficar ali sem mim. 

E eu ainda falei com o Dani pra dar uns pegas nele e beija-lo também... o Dani foi um fofo e atendeu meu pedido, e a essa altura já tinha rolado uns beijos a três entre nós. Aquela bagunça típica que já tive o prazer de narrar aqui outras vezes.  

Dani e Marcos foram embora; Paulo e eu terminamos a balada juntinhos, só nós dois, ali dançando e beijando. Vai entender né... mas ao menos foi gostoso, fiquei do jeito que queria e, definitivamente, me sinto muito bem quando estou ao lado dele.


terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Passivos que metem bem.

eu definitivamente queria abolir essa dicotomia ativo/passivo...

Não as práticas em si, mas a importância e a hierarquia que muitas vezes são dadas. 

Queria abolir o efeito que essa hierarquização nos causa. Queria que as pessoas pudessem transitar mais entre as práticas.

Queria menos caras ativos com medo de se sentirem "rebaixados" por fazerem passivo. 

Queria mais caras ativos com mais coragem pra experimentar... e [fatalmente] gostar.


Queria mais passivos com 'coragem' e disposição pra meter. Acho que encontraríamos grandes talentos e veríamos performances memoráveis. 

Acho que passivos tendem a ter mais cuidado na hora de enfiar o pau, pois sabem bem o impacto que isso pode causar.

Queria que as pessoas tivessem mais abertura pra transar e ficassem menos apegadas à suposta segurança que rótulos e delimitações proporcionam. Porque adoro algo de paixão, devo me ater somente a isso?

O quanto algo "garantido" pode nos impedir de encontrar algo "inesperado"?

O quão valorizamos a segurança que as definições nos trazem?

Enfim... devaneios de uma tarde monótona de terça feira.

The Invaders

Eu ainda estava descansando uns dias pela passagem de ano quando recebo essa sequência de mensagens do Fabinho - o meu tímido disfarçado predileto!


- Meu querido! Sei que você está viajando agora! Que tua viagem seja excelente! Deixa eu te contar que que tá pegando! Dia 25/12 o Marcos me avisou que viria a Recife de 26-28, a trabalho. Ele programou tudo pra vir me ver aqui e queria fazer uma surpresa. A minha reação inicial foi de incredulidade, até pq não se vem pra Recife da noite pro dia, a não ser que vc seja daqui...

- Daí ele chegou na segunda (26) e nos encontramos de noite. Nos outros dias, eu não consegui vê-lo, porque estamos com visitas em casa e ele me avisou muito em cima da hora (nós programamos muita coisa pra fazer com essas visitas). Tá, daí tudo bem. Mas o Marcos me falou que ficou muito frustrado. Que veio pra cá com um plano e saiu tudo errado. Tudo de uma maneira que ele não estava prevendo. Me colocou na parede na terça de noite, falando coisas assim: "eu adianto meu vôo ou não?" Eu falei que não iria e ele adiantou o vôo de volta e foi embora na madrugada da quarta. 

- Ele não conseguiu entender o fato de que tudo foi feito muito rápido e que eu não tive como reagir muito bem. Até porque eu estou cheio de atividades aqui em Recife. 

- Enfim... dia 30 conversamos sobre tudo isso e sinalizamos um entendimento. MAS... eu fiquei bem chateado com tudo e estou muito desmotivado com o nosso relacionamento. Penso nele e só me vejo magoando-o. 

- Sei que o Marcos teve a melhor das intenções, ele é um fofo, um príncipe, tem um coração gigantesco,amoroso, em suma um cara maravilhoso. Mas eu tô muito desmotivado... parece que isso tudo veio e deu uma chacoalhada em mim. 

- Não sei o que faço. 

- Hj no almoço ainda tocou a música da Whitney Houston, "i have nothing" e eu fiquei super pensativo... não sei o que falo pra ele... estou evitando falar, dizendo que estou ocupado e tal, mas não tou me sentindo verdadeiro... 


Eu confesso que fiquei um pouco incrédulo quando li o relato do Fabinho e o sangue me subiu à cabeça por imaginar uma situação tão invasiva como essa.


O Fabinho já namora o Marcos há quase um ano. Eles vivem na mesma cidade, só que a família do Fabinho é de Recife. E ele vai muito pouco a Recife, umas duas ou três vezes ao ano. A família dele é muito apegada, são muito unidos e estão sempre juntos, então quando o Fabinho vai pra lá, é uma alegria só e ele fica o tempo todo em função dos pais, que inclusive já são mais idosos. 

Agora tente você entender o que se passa na cabeça de uma pessoa dessas: o Marcos tem o Fabinho o ano todo pra ele. Daí justamente no final do ano quando o Fabinho viaja pra ficar com a família o Marcos me tira da cartola uma viagem a trabalho e vai exatamente pra cidade da família do Fabinho pra ficar com ele e fazer programas por lá. 

A situação é tão surreal que acho que o Fabinho na hora ficou sem reação e não conseguiu impor um limite ao Marcos e simplesmente dizer "não, não venha, é totalmente fora de propósito você vir". Sim, porque este é o momento em que o Fabinho está dedicado à família e fico pensando por que cargas d´água o Marcos quis sair do conforto da casa e da cidade dele pra "sequestrar" o Fabinho em plena terra natal. 

O Fabinho não é assumido pra família, nem pretende ser, então não tinha como o Marcos se integrar, ficar lá na casa dele, passar o dia com os familiares. Ainda que houvesse a possibilidade, mesmo assim seria inadequado, porque o foco do final de ano é a família, não o namorado.

Bom, eu falei um pouco disso tudo pro Fabinho e disse que muito provavelmente o Marcos não tivesse feito isso de caso pensado, mas mesmo por isso era importante dizer a ele o absurdo da situação, a completa invasão de privacidade que ele havia feito. Não tinha por que querer ficar com o Fabinho no único momento em que ele estava com a família. E ele simplesmente se programou e "comunicou" que estava indo. 

Isso não é a 1ª vez que acontece no namoro dos dois. Fabinho já tinha me relatado uma dificuldade de colocar limites no Marcos. Ele parece simplesmente desconsiderar os desejos do Fabinho e os seus projetos individuais. Sim, o Fabinho tem projetos profissionais e atividades cotidianas que não necessariamente envolvem o Marcos e ele parece ter dificuldade em aceitar isso e às vezes tenta boicotar.


Por exemplo, às vezes ele tinha dificuldade em respeitar a vontade do Fabinho de não transar, fazia brincadeiras de mão sem graças, obscenas, que deixavam o Fabinho constrangido... se irritava quando Fabinho dizia que precisava estudar, ou fazer um curso à noite. Pro Marcos, é como se Fabinho tivesse de estar o tempo todo disponível pra ele. 

Só que o Marcos já é um cara mais velho, estabelecido profissionalmente, se sustenta, ganha muito bem. Fabinho é mais novo e ainda está batalhando um lugar ao sol, é esforçado e quer melhorar de vida e não depender dos pais.

Eu o conheci em uma ocasião. É um cara correto, gente boa, gosta de verdade do Fabinho. Esse é o 1º namoro gay dele, já foi casado com mulher anteriormente, então de certa forma é tudo meio novo. Mas ao mesmo tempo, me soa muito impetuoso, invasivo, com dificuldade de respeitar o espaço do outro e assumiu naturalmente uma posição de "provedor" na relação. O Fabinho não é a pessoa mais incisiva do mundo, então acaba havendo um desequilíbrio e ele tá tendo de aprender, a duras penas, a ser capaz de impor um limite mais saudável e a dizer "não". And NO means NO!!!


Uns dias após o acontecido (e o desfecho "trágico" da antecipação do vôo do Marcos) o Fabinho chegou a pedir um tempo na relação numa conversa por telefone, mas acabou voltando atrás - me "justificou" a decisão dizendo amá-lo de verdade e que não queria ficar longe dele. 

Ele não entrou em muitos detalhes, mas eu sinceramente espero que eles tenham tido uma boa conversa e que o Marcos tenha ficado mais ciente desse tipo de comportamento inconveniente que ele tem e dos riscos que isso traz para a relação deles. Sim, porque esse é um tipo de pressão que vai minando o outro até um momento em que ele passa a evitar o parceiro, perde o prazer da companhia e até pode focar o desejo em terceiros.


E numa relação entre dois homens, isso por vezes pode acontecer com mais intensidade.  

Em síntese, fico pensando em como é importante respeitar o espaço individual do outro e de como, muitas vezes, as pessoas não estão dispostas a fazer isso, acham que isso não deve acontecer inclusive. Assumem uma postura invasiva, controladora e sufocante, na ilusão de que com isso conseguirão controlar seu parceiro... ledo engano meu caro control freak! Atitudes como essa tendem a ser uma bomba relógio e o efeito negativo vai estourar sobre você quando menos esperar. 


Então pense nisso, relaxa esse forevis, larga de ser chato e deixa o outro respirar!

Pais e filhos - conflito de gerações

Nunca escrevi um post falando mais especificamente sobre meu pai. 

Mas ontem tivemos uma conversa muito interessante, que resume de forma muito precisa uma série de opiniões dele a meu respeito e a forma como ele enxerga o mundo (especialmente em relação aos filhos dele).  


Há umas semanas o Laio (aquele do casal) escreveu dois posts no face também relatando diálogos com o pai. 

Num 1º o pai brincava com ele, falando que ele estava 'perdido na orgia' (ao que o Laio retrucava que era experiente e cuidadoso o bastante pra entrar na orgia sem nela se perder). #adoro

Num 2º post o pai de certa forma cobrava dele uma situação material melhor do que a que ele tinha e o Laio de forma sutil dizia que isso não era o mais importante da vida (eu comentei dizendo que os pais são todos iguais, e que isso se explicava basicamente por uma 'diferença no repertório'. E claro... porque eram pais).


Meu pai é um cara extremamente conservador. Conservador nas idéias e conservador quanto a assumir riscos. Isso se explica basicamente pela formação cristã rígida e pelo fato de ele próprio ter perdido o pai muito cedo, de forma repentina, o que gerou muitas dificuldades em uma família de muitos irmãos. A morte do meu avô foi um evento bastante traumático e que marcou toda a trajetória da família a partir de então. 

Ontem eu falava pra ele sobre alguns projetos meus pra 2017 que destoam do que se espera de uma trajetória profissional linear. E não foi a 1ª vez que falamos disso, já tivemos alguns outros embates anteriormente. Minhas escolhas profissionais e a trajetória que construí foram muito, mas muito diferentes do que ele vislumbrou pra mim e em diversas ocasiões isso lhe causou estranhamento e incômodo. Creio que por diversas vezes ele deve ter se perguntado: mas o que será que esse menino pretende da vida?  E é aí que a tal "diferença de repertório" faz com que qualquer tentativa de resposta dada não ajude em muita coisa.

O interessante é que onde eu enxergo uma oportunidade rica de vivência, ele enxerga dificuldades e, acima de tudo, riscos diversos. (e olha, os últimos anos têm me ensinado que vale a pena sair da zona de conforto e se permitir mudanças e novos desafios... e que pra isso ter mais chance de dar certo, planejar e amadurecer as questões e novos projetos é fundamental!)

Disso foi um passo pra nossa conversa entrar nos temas: "bebida" (o termo que ele usa, de forma pejorativa), homossexualidade e drogas. 

Sobre "bebida", ele disse que tinha muito receio do fato de eu e meus irmãos bebermos, pois há vários casos de alcoolismo na família da minha mãe e ele quis reforçar que há um componente genético envolvido e que precisamos estar atentos a isso. Olhando assim, parece que eu e meus irmãos somos "bebuns", mas não, de fato apreciamos algumas bebidas como qualquer outro cidadão comum. Mas meu pai disse que queria ter a tranquilidade de que nos alertou devidamente a respeito disso.

Sobre "homossexualidade" (palavra dita num tom muito formal), ele me relembrou os riscos da atividade sexual fora do casamento (ou seja, com múltiplos parceiros) e que havia atualmente no país uma epidemia de sífilis (já abordei o tema nesse post aqui), além de um grande crescimento no número de novos casos de HIV.

Eu retruquei dizendo que isso não era algo exclusivo de gays, mas de qualquer pessoa sexualmente ativa. Ao que ele respondeu: mas estamos aqui falando da sua situação. Eu não tenho esse risco, porque tenho apenas a sua mãe de parceira. Eu disse então que há diversas estratégias de prevenção para as situações relatadas e que sempre faço uso delas.

Mas claro... pensar que meu pai vai achar normal alguém com múltiplos parceiros é querer demais... O interessante é que ele enxerga, prioritariamente, o risco. E acho que na equação dele, a existência do risco deveria ser justificativa mais do que bastante pra vc não fazer determinada coisa, não embarcar em determinada experiência. O risco é maior do que a estratégia de prevenção (por que, afinal, ela pode falhar, não é mesmo?).

O terceiro ponto - drogas - foi o mais interessante. Eu há alguns anos já tinha falado pra ele que havia experimentado maconha e que tinha uma visão mais liberal sobre o tema. Daí ontem ele me confessou que ouvir isso de mim naquela ocasião fez um mal muito grande a ele, que ele não tinha me criado pra isso e que via com muita preocupação o fato.

Meu pai não faz muita distinção entre os vários tipos de drogas e pra ele o uso é sempre problemático (tendo como exemplo as pessoas que desenvolvem traços severos de dependência). Não há meio termo nesse assunto e pra ele, o mundo ideal seria aquele das campanhas que pregam 'um mundo livre de drogas' (creio que ele nem saiba da existência de drogas sintéticas...).

Eu tentei polemizar e ampliar a discussão falando de uso recreacional, que a visão do usuário dependente e sequelado não pode ser tomada como única possibilidade e que há milhares de pessoas que fumam maconha sem que isso traga prejuízos à vida social e profissional delas (e olha que eu nem fumo maconha, muito esporadicamente...).

Lembrei ainda que em muito pouco tempo a maconha estará totalmente descriminalizada na maior parte do mundo, e que perante situações de risco, é aí que entra o discernimento de cada um para fazer uma avaliação desse risco: fumar uma pedra de crack é muito diferente do que fumar um cigarro de maconha.

Mas pra ele, tudo está contido num plano sequencial. Você começa com maconha e fatalmente chega ao crack e à cocaína. Vc começa tomando uma taça de vinho e, sem perceber, em algum tempo estará tomando uma garrafa. Tudo bem linear e determinista.

Eu tentei despreocupa-lo, e perguntei se ele acreditava que eu e meus irmãos tínhamos o mínimo de juízo na vida: ele disse que sim e que tinha muita segurança de que toda a família estava entregue nas mãos de deus (ainda que eu pudesse não ter essa visão, para ele era muito claro isso). Eu reforcei o tema dizendo que se nós não tivéssemos juízo, muita coisa ruim poderia ter acontecido já, e não aconteceu.

Falei que determinadas escolhas minhas tinham de ser lidas como a busca por diferentes experiências de vida, que eu acho saudável sair da zona de conforto e que a vida é uma só, precisa ser vivida. 

Fazendo uma análise de toda a conversa, eu imagino que seja difícil pra ele mesmo. Se eu seguisse exatamente a trajetória linear que meu pai vislumbrou pra mim, eu seria médico no interior, teria meu consultório, estaria casado [com uma mulher], teria um casal de filhos e algum cargo na igreja. Nesse momento da vida, eu já seria um respeitado pai de família e estaria basicamente preocupado com a criação dos meus filhos, netos dele.

Só que nada poderia ser mais diferente do que a realidade. Eu sou um cara que gosta de beber, sem pretensão de casar e ter filhos, que tem múltiplos parceiros sexuais e, pra piorar, que não vê grandes problemas no uso de algumas drogas. Dificil, né? Deixei claro que isso não fazia de mim uma pessoa melhor ou pior e que não cabiam julgamentos morais sobre tais escolhas (e aqui, basicamente, estamos falando de escolhas que fazemos ao longo da vida... bem diferente da falácia - já superada - de que ser gay é uma "escolha")

Eu já tive altos ressentimentos pelo meu pai durante muitos anos... cheguei até a pensar que ele era o 'grande culpado' por eu ser gay... Hoje, felizmente, temos uma relação bacana, nós temos assuntos em comum, eu o admiro por uma série de coisas e me vejo cada vez mais parecido com ele em diversos aspectos da minha personalidade e do meu modo de agir. Mas isso foi uma construção de anos, com auxílio de uma boa terapia e com um mínimo de disposição para buscar essa aproximação.


Eu juro que consigo perceber o cuidado dele ao me dizer tudo isso, para além da visão conservadora da vida. Nisso não tenho do que reclamar, eu e meus irmãos sempre fomos prioridade pros meus pais e nunca me senti desamparado (ao contrário de alguns amigos que viviam meio que largados, os pais não estavam muito a fim de acompanhar a criação). Tudo bem que meu pai não foi a pessoa mais carinhosa na infância e adolescência, nos educou com mão de ferro e sem muita abertura pra diálogo. Mas isso se ameninou bastante depois que nos tornamos adultos, saímos de casa e hoje ele é um pai bem mais afetuoso do que foi anteriormente.


Concluindo o post, eu acho importante termos a consciência de que muitas de nossas escolhas provavelmente não farão sentido (ao menos de início) e até poderão chocar nossos pais (e se um dia formos pais, isso também acontecerá conosco fatalmente). E que é importante ter em mente de que devemos criar nossa própria trajetória de vida, com aquilo que almejamos, ainda que seja diferente do que nossos pais vislumbraram - por mais difícil que possa ser.

Ser autêntico é lutar por aquilo que se quer e que se acredita lhe seja mais próprio.